Rieu

24/07/2015

Procura-se companhia para sair de vez em quando


Procura-se uma companhia que tome vinho e se embriague numa taça de cristal
Déa Januzzi

Mulheres sem paciência para relacionamentos sérios e longos procuram uma companhia para sair de vez em quando, que goste de comida japonesa, incluindo os shashimis, que tome vinho e se embriague numa taça de cristal, dessas enormes, com profundidade suficiente para mergulhar os pensamentos.

Ou que queira experimentar um suco verde da culinária viva de vez em quando, para desintoxicar os lugares mais secretos. Nem vegetariano radical nem carnívoro em excesso.

Procura-se um homem que goste de acupuntura e de massagem. E não tenha preconceito contra a meditação com todos os nomes de Deus.

Um companheiro que continue a morar na própria casa e ela também na dela.

Procura-se um homem que goste de flores, mas também se esqueça de que elas existem por dias até que elas chamem a sua atençao porque precisam de seus cuidados para não murchar de vez.

Não precisa ser bem-sucedido financeiramente nem profissionalmente, mas que saiba rir e não precise ficar mostrando que está em forma, que clareou os dentes, que frequenta uma academia e que vai à podóloga.

Um companheiro normal, com seus defeitos para compartilhar com os dela. E os vícios também, porque ela tem muitos. E ele sempre se lembre que provedor hoje é o da internet.

Procura-se um homem que saiba expressar emoção, que declare sentimentos, faça poesia ou seja até um poeta suicida, desses que dão murros na parede até sangrar e sair uma rima perfeita.

Pode ser um artista sem palco, um músico sem instrumento, mas que saiba tocar a alma e não se esqueça nunca de que foi jovem um dia. Um companheiro que não fique o tempo todo vestido com a armadura enferrujada do herói ultrapassado.

Um companheiro que goste de música, de cinema e também de não fazer nada, de ficar em casa quando todo mundo vai para a rua. Alguém capaz de entender o significado da palavra simplicidade, que goste de andar descalço e de vento nos cabelos, mesmo que já embranquecidos, que não precise de plásticas no corpo nem no espírito, que saiba envelhecer e goste de cada nova etapa da vida.

No meu correio sentimental só cabem homens que saibam ser pais afetivos e não apenas biológicos, que adotem os filhos mesmo que sejam deles mesmos.

Homens que voem mesmo que não tenham asas e que não precisem mostrar a força, mas enxerguem o tênue fio que pode se partir a qualquer momento, mas que deixe uma luz pelo caminho.

Esta crônica foi publicada originalmente pelo jornal Estado de Minas, com o título de “Correio Sentimental”.

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