Onde há dois judeus, há três
opiniões. Este tradicional provérbio sobre o cotidiano judaico resume o conceito
de que nem todo crítico do governo de Israel é antissemita, assim como aquele
que costuma defender o país não obrigatoriamente pertence à comunidade judaica.
Como jornalista e profissional de marketing, tenho proferido muitas palestras
nas quais evoco o direito à liberdade de expressão, mas também destaco a
importância do respeito à contrariedade de pensamento. O debate construtivo,
baseado em análises consistentes, não é apenas bem-vindo, como enriquece
culturalmente os envolvidos e enobrece a sociedade democrática. Por outro lado,
posturas exacerbadas são consequência da ausência de raciocínio, da escassez de
argumentos sólidos, de discriminações incutidas covardemente pela história ou
utilizadas de forma leviana e conveniente nos dias atuais como sendo
"politicamente corretas". Manifestações radicalizadas embutem o
pseudo-sentimento de que a coexistência com o diferente é uma anomalia da
sociedade e, portanto, erradicá-la se torna uma incontestável decisão e uma
premente necessidade. Este perigoso pensamento não podemos reviver!
No
meu dia a dia, analiso as diferentes mídias e o impacto causado pela condução de
cada reportagem, assim como avalio o conteúdo incluso em suas entrelinhas. No
caso específico do conflito em Gaza, o desequilíbrio da mídia fica explícito até
para os mais leigos receptores da informação. Descaradamente, o jornalismo
bombástico utiliza escusos artifícios para gerar simpatia perante a opinião
pública e privilegiar seus próprios anseios, sejam eles ideológicos, comerciais
ou ambos. E faz isto não apenas no espaço editorial, como seria aceitável em
termos éticos, mas subliminarmente, ferindo os princípios mais elementares do
juramento profissional. Ao omitir de forma covarde e acintosa e deturpar de
maneira proposital e seletiva, a irresponsável manipulação contribui para formar
e consolidar premissas através do ódio e, ao mesmo tempo, privilegiar valores
morais que em nada agregam ao engrandecimento de uma sociedade dita
civilizada.
Assim como durante um mês fomos 200 milhões de técnicos de
futebol, enquanto durar este conflito seremos PHDs em questões do Oriente Médio.
Se, mesmo no controverso mundo do futebol, há ocasiões em que a derrota é
considerada incontestável, na deprimente realidade das guerras interesses
políticos se unem ao marketing letal para bombardear a consciência coletiva e
gerar resultados que, mesmo quando expostos a uma goleada, são apresentados como
sempre satisfatórios por aqueles que têm voz, mas nem sempre sinceridade, para
contar a história. Assim, cria-se a emotiva imagem de um lado e a questionável
razão do outro; as eternas vítimas de um lado e a constante arbitrariedade do
outro; o contundente discurso de um lado e a provocativa dúvida do outro; o
certo absoluto de um lado e o permanente equívoco do outro. A massificação
destes inconcebíveis conceitos pré-moldados fragiliza a capacidade de pensar,
tão indispensável em situações de crise, e engessa a ação dos que entendem o bom
senso como o único caminho plausível.
Estamos diante de um lamentável
espetáculo circense em que a inocente plateia, vendada ou vendida, é
hipocritamente induzida a participar com insultos preconceituosos e a aplaudir
atitudes insanas. No momento em que o público abrir os olhos perceberá que a
interpretação destes fantoches é tão despropositada quanto irracional e que, ao
cair das máscaras, esta nefasta representação ilusionista terá servido apenas
para torpedear a construção de uma sociedade verdadeiramente humana – cujos
requisitos indispensáveis incluem noções de respeito, confiança e reconhecimento
mútuo, além do real desejo de se alcançar um convívio pacífico e
igualitário.
Que fechem logo as cortinas deste degradante show de
horrores que vilipendia a verdade e humilha a inteligência. Que tenhamos o
mínimo de sensatez e sabedoria para usar o inigualável poder da educação como a
única arma para alcançarmos a tão almejada harmonia, evitando que, daqui a 100
anos, sejamos obrigados a lastimar as consequências desta tragédia. Mas que a
paz não seja apenas uma eterna retórica ou uma formal assinatura, e sim o franco
entendimento de que é a única possibilidade para que o choro de hoje se
transforme em abraços amanhã.
“ÀS VEZES, A ÚNICA COISA VERDADEIRA EM UM JORNAL
É A DATA” (Luiz Fernando Veríssimo, escritor
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